“O ódio é a melhor fonte de motivação”, assim foi escrito por um aluno da 5ª série, durante uma oficina de práticas artísticas com professores de francês e artes plásticas, um fragmento do que poderia representá-lo ou identificá-lo (estas são as palavras dos professores). A frase vem acompanhada de uma imagem (abstrata), uma espécie de autorretrato abstrato. Conhecido por ser um encrenqueiro, ele lança mais uma pedra no lago: a obra, que tem o formato de um fólio, deve ser exposta.
Essa pequena história ilustra os efeitos, a articulação do social e do singular, da subjetividade. Essa frase surgiu após um trabalho; ela vem de uma construção. Mas acontece que, sob uma forma um pouco diferente, é uma máxima que circula nos jogos online.
Partindo das perguntas que levantamos para esta noite: Quais pontos de apoio conseguimos identificar? Avançamos na especificidade do ódio que hoje se infiltra por toda parte em nosso laço social? Se algo mudou, podemos propor uma escrita sobre isso? Gostaria de lembrar alguns pontos de apoio clássicos que permitem avançar em direção a uma escrita. O ódio é um afeto, nesse sentido, deve ser reprimido; o recalque não tem efeito sobre o ódio, o recalque incide sobre o significante.
Mantenham em mente este “sem efeito”. É importante, de certa forma, agir no lugar certo, na dimensão correta.
Em seguida, é necessário dissociar a agressividade do ódio. Na edição da Revue lacanienne, publicada no outono, que também acolhemos aqui, em seu artigo Jean-Paul Beaumont nos oferece elementos: “– a agressividade contra o semelhante que pode encontrar uma sedação na designação do terceiro imaginário ‘inimigo’. A menos que uma operação simbólica permita a relação pacificada com o próximo; – o ódio propriamente dito que permite a aproximação da Coisa sem reconhecê-la, pelo processo imaginário de projeção. Nesse sentido, está mais próximo do gozo, muito mais do que o amor, sendo, em vez de seu oposto, sua rival.” Prevalência, importância do imaginário aqui – voltarei a isso em um instante – mas antes, para aproximar um pouco mais o ódio, abordando-o de outro ângulo, pela articulação do singular e do coletivo, da subjetividade e do laço social, vou me valer de um pequeno trecho do texto de Marc Morali, na mesma edição: “Brecht já, muito antes de Lacan, nos alertou: a besta imunda não está morta, e por uma razão, ela adormece em cada um de nós, na raiz do nosso ser. O impossível se disfarça de interdito, o que cria a transgressão”. O impossível, ou seja, o real, se disfarça…
É uma das questões que levanto regularmente: como se veste a estrutura? De quais andrajos se reveste? Hoje, o laço social dominante (ou seja, o discurso do capitalista) não vem duplicar o simbólico: resumidamente, o social não vem duplicar em suas prescrições a falta que constitui a captura na linguagem de cada ser-falante. A castração, essa operação simbólica, hoje é interpretada como uma restrição de gozo (cf. a conferência de Martine Lerude no Grande Seminário). Esse fim da duplicação do simbólico pelo social tem um primeiro efeito evidente sobre o “animal imaginário” (Valère Novarina) que é o ser-falante, que é oferecer ao imaginário a extensão de seu campo, de suas potências, apagando aparentemente a dimensão RSI da restrição de gozo…
No entanto, a articulação borromeana (RSI) – na qual cada um está inserido, que cada um tem de escrever, impede a relação dual. R, S, I estão ligados a três, mas não dois a dois. Para descrever a vestimenta contemporânea da estrutura RSI, eu frequentemente falava de esquecimento da função simbólica; vou acompanhar Martine Lerude em seu discurso no Grande Seminário, para falar mais simplesmente de esquecimento do simbólico. Pode-se dizer que hoje em dia, comumente, no uso, na circulação, na vestimenta da estrutura, o simbólico é esquecido. Portanto, é o imaginário que predomina, a projeção e suas corolas: a agressividade e o ódio.
No último sábado, no EPEP, que teve como tema “Histórias de amores e ódios”, Tom Husson, doutorando que trabalha sobre “O ódio nas redes sociais”, fez uma intervenção. Ele falou sobre a rivalidade invejosa nas redes sociais (reencontramos a agressividade da inveja). A inveja sustentada, solicitada pelo discurso capitalista: o objeto, a produção no discurso capitalista está do lado do outro. Para que o sujeito a recupere, ele deve fazer todo o trajeto pelo lado do outro, é o inimigo que possui o que eu quero. Mas Tom Husson trouxe uma ideia muito interessante: o ódio como última esperança… Ouve-se a proximidade equívoca, última esperança-desespero, último bastião antes do desespero.
Por que se apoiar no ódio? Porque o discurso histérico não tem efeito sobre o discurso capitalista. O sujeito se exaure na busca de um impossível que faria o discurso capitalista desmoronar… Exaurido, sem recursos diante desse sem efeito, sem recursos diante da roda dos discursos, resta o ódio (que talvez borde a pulsão de destrutividade). O que poderia fazer parar é o recurso ao simbólico esquecido… Ele pode ser solicitado e entrar novamente na dança. Para isso, é melhor encontrar um analista, mas talvez haja outros caminhos, esse será o nosso tema do próximo ano: “O que fabricamos, invenções e subjetividade.”